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terça-feira, 28 de agosto de 2012

SAUDADES DA MINHA INFÂNCIA (TROVA)















Malu Monte                                                                   


Ah que saudades da minha infância...
Daquela menina a brincar de esconde-esconde
Ver o dia acabar e ninguém me encontrar
Brincar de médico ou mãe e filho, isso pouco importaria
Mas, no fazer de contas, tudo eu podia
Ser professora a dar aula pra bonecas assustadas
Ah... Como eu gostaria!
Ah que saudades da minha infância...
Dos tombos de bicicleta
Dos carrinhos de rolimã
De ver a noite cair sem uma ponta de voz nos dias em que eu me punha a gritar.
Ah que saudades da minha infância...
Tentada pelas guloseimas preparadas por minha mãe
- Mas que menina magra! Quando é que vais encorpar?!
A coitada mais parecia a bruxa malvada querendo me jantar!
Ah que saudades da minha infância...
Das histórias de assombração que a mãezinha contava
Não faltava: Lobisomen, mula sem cabeça, mulher de branco ou sei lá...
E quem disse que eu dormia sem a cabeça tapar?...
Ah que saudades da minha infância...
Quando banho era castigo
Só doido, trocava a brincadeira por asseio...
Não incomodava o pescoço ornado com negros cordões de suor e poeira
Ah!... Talvez essa seja a tradução perfeita
Isso é ser uma criança verdadeira!
Ah! Que saudades da minha infância...
Dos passeios que fazíamos, sem luxo, sem riqueza
Aquilo sim era uma beleza
Pura liberdade de expressão!
Construir castelos na praia
Vê-los virar buracos quando a onda os lambia
E, ao fim do dia, a arte se misturava com a poesia.
Eu, menina vaidosa, toda prosa,
Pensava estar mais bela
Iludida com um bronzeador que comprara
Mas ao chegar em casa, que bronze, que nada!...
Após o banho vinha a constatação
Estava mais branca que vela de procissão!
E o tempo passava, numa mocinha eu me transformava
E a vaidade também crescia
A catar conchinhas na praia um belo colar eu fazia
Ao usá-lo uma sereia eu me sentia
Mas a criança ainda insistia em bagunçar
Ir à praia pegar jacaré ou boiar com bóia de borracha
Sem me importar em encher os fundilhos do maiô com a areia
Caçar tatuí na beira do mar e pedir à mãe pra fritar
Hoje, esse crustáceo quase não existe
Quiçá no futuro o iremos encontrar!
Mas quem na idade madura se atreveria revelar essas proezas?
Pois eu não me envergonho
Ao contrário, penso ser motivo de orgulho!
E por que não seria?
Não mais existe criança hoje em dia
Infância é algo em extinção.
Pequenos, querendo ser adultos,
Antecipando o seu tempo
Adultos, querendo parecer jovens
Linguagens, imagens, que não condizem com idade ou geração.
Esse mundo tá mesmo perdido!
Mas não desejo voltar no tempo
Do passado, guardo doces lembranças
Do meu tempo de criança
No presente, sou muito feliz
Planejo viver muitos anos
Afinal, o futuro me espera
Bem debaixo da minha janela
Bem debaixo do meu nariz!